O texto a seguir é impróprio para menores de 18 anos!
— Vá de avião homem! Aquilo não cai não! — dizia um dos pastores presentes.
— Eu tenho medo! Não gosto não! Vou de ônibus. Vou de leito e de ônibus! Não adianta que não mudo de ideia! — disse Setembrino Cícero, padre católico de formação e pastor evangélico por opção.
E assim agiu Setembrino. Ao comprar sua passagem, até o homem do guichê parecia querer convencer o padre-pastor: — Moço! Finge que eu não disse nada, mas por mais um pouco de dinheiro, o senhor compra a passagem de avião.
Setembrino fingiu que não ouviu, fechou a cara e estendeu a mão, como a dizer: “Me dá logo essa passagem!”.
Ao deitar, naquela noite, Setembrino Cícero fechou as pálpebras para a realidade, pensando em porque as pessoas queriam tanto que ele fosse de avião para o Rio de Janeiro. Quando abriu os olhos, a pergunta ainda badalava na sua cabeça. A resposta óbvia, o ganho de tempo, não satisfazia sua mente. Pensou que era melhor esquecer e não se preocupar mais.
Como a viagem era para um congresso de pastores que duraria dois dias e Setembrino ficaria hospedado no mesmo hotel onde aconteceria o evento, a bagagem era pouca. Pensou mesmo em dispensar a carona dos amigos e ir de Metrô, mas sabia que deixaria os companheiros, de sacerdócio, magoados. Pacientemente aguardou.
Setembrino já estava sem graça com a algazarra que os três amigos faziam do lado de fora do ônibus, enquanto colocava sua bagagem-de-mão no bagageiro. Acenavam, davam batidinhas no vidro, colocavam o dedo em riste como dizendo: “juízo, hein!”.
Cícero, como se apresentava e gostava de ser chamado, deitou sua poltrona no máximo, deixando-a quase esticada. Meia-noite, com sono e os amigos já tinham ido, aprumou-se na poltrona antes mesmo do motorista fechar a porta do ônibus e apagar a luz interna.
Com os olhos fechados, o clima agradável e o perfume de dama-da-noite, Cícero começou a pegar no sono. Acordou sobressaltado com a lembrança de que não existia nenhum arbusto de dama-da-noite na rodoviária e muito menos dentro do ônibus. Quando abriu os olhos a expressão “Meu Deus Do Céu!” foi automática.
Um par de pernas, coxas que pareciam torneadas por Aleijadinho e pegadas por empréstimo da Ivete Sangalo, certamente era a fonte daquele perfume. Os olhos de Cícero, esbugalhados, começaram a subir, com esforço, o resto daquela mulher de cabelo vermelho. Um pensamento, rapidamente rechaçado, de que poderia ter escolhido outra poltrona, passou pela cabeça de Setembrino.
Ex-fumante há dez anos, Cícero sentiu até vontade de fumar. “Que noite será essa?” Perguntou a si mesmo, sentindo um arrepio percorrendo o corpo e uma satisfação adolescente que trazia junto um maroto sorriso.
— O senhor é padre? – perguntou a moça, com uma voz rouca “a la Carolina Ferraz”, ao notar a Bíblia que Cícero carregava.
— Sou padre, mas estou afastado do sacerdócio católico. Hoje, continuo no sacerdócio, mas como pastor.
— Que bom, pastor! Estou tão aflita com essa viagem!
A moça ficou esperando uma continuação da conversa, que o pastor Cícero não conseguiu fazer acontecer. Setembrino rezava e torcia para que os leitos ficassem tomados, mas foi em vão. As luzes foram apagadas e somente as do corredor foram mantidas acesas. Na área do leito, somente ele e a moça ruiva.
A rodoviária já ficava para traz quando as luzes do corredor foram apagadas e surgiu a luminosidade fraca da TV. Um filme de suspense ia começar.
— Pastor! Pastor!
— Sim!
— O senhor não quer sentar um pouco aqui? Eu fico mais tranquila!
— (…)
As cortinas foram fechadas e o filme começou!
Silvio,
É este conto a que se referiu no Linkedin, quando disse que tinha escrito um conto erótico?
Realmente, não senti clima algum…risos… Sem querer ser crítica, lembra mais uma crônica. Faltou detalhar os sentimentos, os pensamentos, as reações de um e outro personagem. E também dar detalhes de cada personagem: o padre tem que idade? E a moça em questão? Eu omitiria essas definições à la personalidades públicas (Ivete Sangalo, Carolina Ferraz). Isso fica bem em uma crônica leve da Vejinha, tipo as de Ivan Ângelo, Walcyr Carrasco. Foi essa a sua intenção? Caso tenha sido, releve o meu comentário.
E justamente na parte em que entra a personagem feminina me deu a impressão de que você “correu” para chegar ao desfecho da história. E por que a moça perguntou: “O senhor não quer sentar um pouco aqui?” Eu não entendo muito bem dessa história de viajar em ônibus leito e assistir TV ao mesmo tempo: assiste-se da mesma poltrona uma única TV? Será que a fala da moça deveria ser essa mesma? Desculpe-me, é ignorância minha mesmo.